sábado, 27 de novembro de 2010

Cajueiro Velho

Cajueiro velho
Vergado e sem folhas
Sem frutos, sem flores
Sem vida, afinal
Eu que te vi
Florido e viçoso
Com frutos tão doces
Que não tinha igual
Não posso deixar
De sentir uma tristeza
Pois vejo que o tempo
Tornou-te assim
Infelizmente também é certeza
Que ele fará o mesmo de mim

Já trago no rosto
Sinais de velhice
Pois da meninice
Não tenho mais traços
Começo a vergar como tu, cajueiro
Que foi meu companheiro
Dos primeiros passos
Portanto
Não tens diferença de mim
Seguimos marchando
Em uma só direção
Agora me resta da vida o fim
E da mocidade a recordação

João Carlos

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

A Porta

"Sou feita de madeira
madeira, matéria morta
não há coisa no mundo
mais viva do que uma porta

eu abro devagarinho
pra passar o menininho
eu abro bem com cuidado
pra passar o namorado

eu abro bem prazenteira
pra passar a cozinheira
eu abro de supetão
pra passar o capitão

 


eu fecho a frente da casa
fecho a porta do quartel
eu fecho tudo no mundo
só vivo aberta no céu!

Sou feita de madeira
madeira, matéria morta
não há coisa no mundo
mais viva do que uma porta"

 


eu abro devagarinho
pra passar o menininho
eu abro bem com cuidado
pra passar o namorado


Vinícius de Moraes

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Ares de Primavera

Flor perdida no vento,
mensageira que veio de longe
traz letra cifrada em suas pétalas,
traz cor que desconhecia,
traz luz que pensei perdida.

Flor celeste, girassol lunar.
Não traz voz, mas pulsar cardíaco.
Sorri, pois sabe que lhe espero. 
Olhe-me, e lhe descubro oculta.
E finge estar perdida,
mas sei que lhe encontro.
E acompanha horas que se foram,
E se aninha no crepuscular da tarde,
na aurora que rompe a madrugada.
Flor que viajou despida de corpo,
que veio apenas na forma de essência.
E visita para depois deixar apenas fragrância,
perfume que encanta e traduz saudade.
Saudade de que, se é objeto oculto?
Se faz-se de mentira cheia de verdades?
Buquê de rosas, espinhos e pétalas.
E no toque de carícia,
oculta-se nos espelhos,
no mundo virtual de sua irrealidade.
E brinda o cálice de doçura e fel,
pois que traz contradição de ser.
E ser é inevitável, não tem rota de fuga,
pois que se encontra no horário,
na data marcada, no tempo perdido,
nas vozes que cantam uma canção,
nas poesias que desfizeram-se em sílabas
que desmontaram-se em letras,
que fizeram o caos viver em harmonia,
que criaram sementes na primavera,
que fugiram levando os outonos,
que roubaram o frio do inverno 
 e criaram o seu próprio verão.
E no calor de si, no afeto suave,
fez-se beijo na face, trocou carícias,
para depois depositar-se nos lábios
que, em seu silêncio, perderam palavras.
Murmuram dizeres, sons sem sentidos
que brotaram em significados,
em sentidos e sentimentos
que, por fim, fizeram-se emoções
que repousaram num cantinho do coração.
 

 

Sutilmente

E quando eu estiver triste
Simplesmente me abrace
Quando eu estiver louco
Subitamente se afaste
Quando eu estiver fogo
Suavemente se encaixe

E quando eu estiver triste
Simplesmente me abrace
E quando eu estiver louco
Subitamente se afaste
E quando eu estiver bobo
Sutilmente disfarce
Mas quando eu estiver morto
Suplico que não me mate, não
Dentro de ti, dentro de ti

Mesmo que o mundo acabe, enfim
Dentro de tudo que cabe em ti
Mesmo que o mundo acabe, enfim
Dentro de tudo que cabe em ti

E quando eu estiver triste
Simplesmente me abrace
E quando eu estiver louco
Subitamente se afaste
E quando eu estiver bobo
Sutilmente disfarce
Mas quando eu estiver morto
Suplico que não me mate, não
Dentro de ti, dentro de ti

Mesmo que o mundo acabe, enfim
Dentro de tudo que cabe em ti
Mesmo que o mundo acabe, enfim
Dentro de tudo que cabe em ti
Mesmo que o mundo acabe, enfim
Dentro de tudo que cabe em ti
Mesmo que o mundo acabe, enfim
Dentro de tudo que cabe em ti.


Composição: Samuel Rosa / Nando Reis

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Cala te


Cala-te

Cala-te, desta paixão desvairada.
Sossega de um amor profundo.
Respira nossa amizade, amada.
E vive teu sonho neste mundo.

Cala-te, deste teus desejos amantes.
Sossega tuas noites de insônia.
Respira nossos carinhos, delirantes.
E vive em espirito, de paz e harmonia.

Cala-te, esta tua boca, doce.
Sossega nos beijos que te dei.
Respira o meu cheiro, que te trouxe.
E vive as horas que lá deixei.

Cala-te, de todo pensamento, amargo.
Sossega em flores amenas.
Respira seus momentos, em sorriso largo.
E vive das lembranças serenas.

Cala-te, esta tua voz, macia.
Sossega em minhas palavras, prometida.
Respira nos encantos da magia.
E vive nos conselhos, de frases proferidas.

Cala-te, por um só momento.
Sossega este teu corpo sagrado.
Respira tua espera, ao sabor do vento.
E vive, alimenta, deste teu amado. 
Angelo Sansivieri

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Setembro... Mês em Que Nasci ( Para meu filho Igor)

Setembro…
Início da primavera
Mês em que nasci

A traquinice da infância
Vai longínqua
A graça da moçoila, de
Inocência frenética
Também
Onde a experiência
Dorida
 

Se fez…
Foram tantos os caminhos
 Largos e longos, que deslumbrei

 Ruelas, onde tropecei e cai
Vezes sem conta, porque acreditei!
Corri veloz
Atrás dos sonhos
E de sonhos, não passaram
Nenhum se realizou
Na dureza da vida
Continuei…

Longa foi a espera no leito
Da esperança, reconstruir o crer
Há que luta, férrea travada

E eis, que
Caminhos, outros se abriram
Com a graça Divina
Onde renasce…
Mulher, mantendo o coração
De criança, o brincar de garota
A emoção da grandeza do amor
Vivido autêntico, sem a ilusão do sonho
Na descoberta da razão
De minha existência…
Setembro que és
Ano após ano
Recomeçado…


Anônimo

Poema da Amazônia

Em meio ao seu verde,
o fogo arde queimando o nosso pulmão.
Os pássaros perdem seus galhos, 
em desespero voam sem rumo na imensidão. 
Os animais correm em círculos,
perdidos na fumaça da morte certa.
Os gritos das aves, dos animais, das plantas... 
Não são ouvidos pelos homens do poder sem visão...
Que não reconhecem o ciclo 
da natureza que tenta em desespero...
Limpar o ar que sujamos 
com nossos carros, nossas indústrias...
Quebrando o ciclo da água,
reduzindo as chuvas... 
Até chegar as grandes cidades, 
nos nossos campos que na seca matarão os gados... 
A abundância das frutas brasileiras 
desaparecerão das nossas mesas.
Haverá dor naqueles que por muitas vezes
jogaram as frutas no lixo...
E lágrimas rolarão sobre os olhos
daqueles que a colhiam para comer...
Sentindo-nos impotentes,
perguntaremos a nós mesmos:
O que fizemos com a nossa Amazônia? 
O que não fizemos por ela..
 
  Regina Eenas Martins

Poema da Árvore

As árvores crescem sós. E a sós florescem.
Começam por ser nada. Pouco a pouco
se levantam do chão, se alteiam palmo a palmo.
Crescendo deitam ramos, e os ramos outros ramos,
e deles nascem folhas, e as folhas multiplicam-se.
Depois, por entre as folhas, vão-se esboçando as flores,
 

e então crescem as flores, e as flores produzem frutos,
e os frutos dão sementes,
e as sementes preparam novas árvores.
E tudo sempre a sós, a sós consigo mesmas.
Sem verem, sem ouvirem, sem falarem.
Sós.
De dia e de noite.
Sempre sós.

Os animais são outra coisa.
Contactam-se, penetram-se, trespassam-se,
fazem amor e ódio, e vão à vida
como se nada fosse.
 

As árvores não.
Solitárias, as árvores,
exauram terra e sol silenciosamente.
Não pensam, não suspiram, não se queixam.
stendem os braços como se implorassem;
com o vento soltam ais como se suspirassem;
e gemem, mas a queixa não é sua.
Sós, sempre sós.
Nas planícies, nos montes, nas florestas,
a crescer e a florir sem consciência.
 

Virtude vegetal viver a sós
e entretanto dar flores.


António Gedeão

Sol de Primavera

Quando entrar setembro
 E a boa nova andar nos campos
Quero ver brotar o perdão
Onde a gente plantou
Juntos outra vez
Já sonhamos juntos
Semeando as canções no vento
Quero ver crescer nossa voz
No que falta sonhar
Já choramos muito
Muitos se perderam no caminho
Mesmo assim não custa inventar
Uma nova canção
Que venha nos trazer
Sol de primavera
Abre as janelas do meu peito
A lição sabemos de cor
Só nos resta aprender
Aprender
 
Beto Guedes



sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Balada De Agosto

Lá fora a chuva desaba e aqui no meu rosto
Cinzas de agosto e na mesa o vinho derramado
Tanto orgulho que não meço
O remorso das palavras que não digo

Mesmo na luz não há quem possa se esconder no escuro
Duro caminho o vento a voz da tempestade
No filme ou na novela
É o disfarce que revela o bandido

Meu coração vive cheio de amor e deserto
 

Perto de ti dança a minha alma desarmada
Nada peço ao sol que brilha
Se o mar é uma armadilha nos teus olhos


Composição: (fagner E Zeca Baleiro)

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Coração de Estudante

Quero falar de uma coisa
Adivinha onde ela anda
Deve estar dentro do peito
Ou caminha pelo ar
Pode estar aqui do lado
Bem mais perto que pensamos
A folha da juventude
É o nome certo desse amor

Já podaram seus momentos
Desviaram seu destino
Seu sorriso de menino
Quantas vezes se escondeu
Mas renova-se a esperança
Nova aurora, cada dia
E há que se cuidar do broto
Pra que a vida nos dê
Flor flor o o e fruto

Coração de estudante
Há que se cuidar da vida
Há que se cuidar do mundo
Tomar conta da amizade
Alegria e muito sonho
Espalhados no caminho
Verdes, planta e sentimento
Folhas, coração,
Juventude e fé.


Milton Nascimento

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Pai

Pai!
Pode ser que daqui a algum tempo
Haja tempo prá gente ser mais
Muito mais que dois grandes amigos
Pai e filho talvez...

Pai!
Pode ser que daí você sinta
Qualquer coisa entre
Esses vinte ou trinta
Longos anos em busca de paz...

Pai!
Pode crer, eu tô bem
Eu vou indo
Tô tentando, vivendo e pedindo
Com loucura prá você renascer...

Pai!
Eu não faço questão de ser tudo
Só não quero e não vou ficar mudo
Prá falar de amor
Prá você...

Pai!
Senta aqui que o jantar tá na mesa
Fala um pouco tua voz tá tão presa
Nos ensine esse jogo da vida
Onde a vida só paga prá ver...

Pai!
Me perdoa essa insegurança
Que eu não sou mais
Aquela criança
Que um dia morrendo de medo
Nos teus braços você fez segredo
Nos teus passos você foi mais eu...

Pai!
Eu cresci e não houve outro jeito
Quero só recostar no teu peito
Prá pedir prá você ir lá em casa
E brincar de vovô com meu filho
No tapete da sala de estar
Ah! Ah! Ah!...

Pai!
Você foi meu herói meu bandido
Hoje é mais
Muito mais que um amigo
Nem você nem ninguém tá sozinho
Você faz parte desse caminho
Que hoje eu sigo em paz
Pai! Paz!...



Fábio Jr.

domingo, 18 de julho de 2010

Tragédia no Lar

"Eu sou como a garça triste
"Que mora à beira do rio,
"As orvalhadas da noite
"Me fazem tremer de frio.

"Me fazem tremer de frio
"Como os juncos da lagoa;
"Feliz da araponga errante
"Que é livre, que livre voa.

"Que é livre, que livre voa
"Para as bandas do seu ninho,
"E nas braúnas à tarde
"Canta longe do caminho.

"Canta longe do caminho.
"Por onde o vaqueiro trilha,
"Se quer descansar as asas
"Tem a palmeira, a baunilha.

"Tem a palmeira, a baunilha,
"Tem o brejo, a lavadeira,
"Tem as campinas, as flores,
"Tem a relva, a trepadeira,

"Tem a relva, a trepadeira,
"Todas têm os seus amores,
"Eu não tenho mãe nem filhos,
"Nem irmão, nem lar, nem flores".

Castro Alves

terça-feira, 29 de junho de 2010

Poema de Inverno

 Dormem as buganvílias, o róscido da manhã.
Gatos que passam, levando sombras consigo.
E por todo o jardim, insectos voltejam,
tontos de janelas.

Acendem-se as primeiras luzes… aracnídeos
montam suas tendas, entre as frestas, da madeira
carcomida.

Caem algumas gotas de água, pendendo das telhas
humedecidas… ao arrepio do vento matinal.

E ao longe já se escutam os primeiros pássaros,
trinando recentes vislumbres, de claridade.

Latem cães… no fim da cidade. 

Choram crianças… cujo os nomes não sei.
Puxo-te para mim. E acordo-te com um beijo.

Vide, amor, é o inverno, que chega!

Jorge Humberto

Movimento do Vento

Os telhados da vila
se aquietam cedo
no tardar do dia,
amornados pelo toco
da vela do crepúsculo.

Mais adiante
da prumada dos tapumes
nos beirais sem janelas,
os ninhos tramados
e os ecos dos pios
anunciam a noite...

Como um manto,
a noite cobre os telhados.
E sob os telhados,
a noite beija.

 



O galo do canto rouco
canta uma vez
e se aninha nas galhas
mais altas da figueira.

O galo ronca.
Silêncio:
a vila dorme.

Edilson José

Poeminha de Inverno


Nos fios ao sol
Piam baixinho
As andorinhas
Quentando frio.

Do céu de palha
Queimada
Chuva de carvão
Flutua até as mãos,
Mãos pequeninas

 


Na esquina
Moça de sobrancelha cerrada,
Face rosada
Esconde as pernas esbranquiçadas

E, da janela,
O menino dos olhos congelados
Espirra um sorriso
Pra rosa vermelha murchada.

Edilson José

Jeca Bento - Arraial da Providência 2009.

Soneto a São Pedro – Patrono dos Pescadores

São Pedro, Protetor dos pescadores,
Ouvi a prece de todos que lutam,
Lançando as redes às águas, labutam
Desde o nascer do sol em seus albores...

Em busca de alimentos, só escutam

O marulhar constante e sonhadores
Vogam no mar... são os trabalhadores
Que apenas com a natureza disputam...

Voltam à casa, após a longa viagem,

Em que enfrentaram ondas com a coragem,
Que Deus lhes dá e o santo os protegeu...

Trazem os peixes que alimentam lares,

Por que trabalham percorrendo os mares...
Foi para isto que o pescador nasceu !

Ialmar Pio Schneider

quarta-feira, 23 de junho de 2010

A Casa

Uma casa se avista em coqueiros
em formas de ripas,
Uma casa enche a vista,
simples bambus
envoltos em barro.
Nem imagina o
que se passará por entre
 as suas portas e janelas
telhado e assoalho.
Tudo é novo,
ingenuidade infantil.
Beleza da juventude...
Ela cresce...
simultaneamente,
crianças crescem.
E à medida que envelhece...
sofre!

A cada perda, cai-lhe
um torrão da parede...
E sorri!
A cada conquista
também festeja.
Vibra em alegria ao
primeiro som da vitrola.
E brinca com os
passos pesados de dança
e sons instrumentais
em seu assoalho.
E se recolhe nas despedidas
de filhos seus sim,
nasceram e viveram em suas entranhas
Por que não mãe?
Pra vê-los novamente?
Certamente não,
nem todos...
Urra dor de mãe...
És matéria, não falas
  - diriam alguns...
 Ilusão, ela diz,
em cada marca.

Em suas gastas e velhas 
paredes...rabiscadas...
com cada imperfeição...
conta tudo que passa,
tudo que viu...
Não te trocaria por nada,
tem mérito de Pai,
tem força de Pai.
Mesmo gasta, mesmo imperfeita
reconheço,
pena dos que não foram
criados em
você...


Ednei Clemente

sexta-feira, 11 de junho de 2010

Alma Gêmea

Por você eu tenho feito
E faço tudo que puder
Prá que a vida seja
Mais alegre
Do que era antes...

Tem algumas coisas
Que acontece
Que é você
Quem tem que resolver
Acho graça quando
Às vezes louca
Você perde a pose
E diz: "foi sem querer"...

Quantas vezes
No seu canto em silêncio
Você busca o meu olhar
E me fala sem palavras
Que me ama, tudo bem
Tá tudo certo
De repente você põe
A mão por dentro
E arranca o mal pela raiz
Você sabe como me fazer feliz...


Carne e Unha
Alma Gêmea
Bate coração
As metades, da laranja
Dois amantes, dois irmãos
Duas forças, que se atraem
Sonho lindo de viver
Estou morrendo, de vontade
De você!...

Quantas vezes no seu canto
Em silêncio você busca
O meu olhar
E me fala sem palavras
Que me ama, tudo bem
Tá tudo certo
De repente você põe
A mão por dentro
E arranca o mal pela raiz
Você sabe como me fazer feliz...

Carne e Unha
Alma Gêmea, bate coração
As metades, da laranja
Dois amantes, dois irmãos
Duas forças, que se atraem
Sonho lindo, de viver
Tô morrendo, de vontade
De você!...

Bate coração!
As metades, da laranja
Dois amantes, dois irmãos
Duas forças, que se atraem
Sonho lindo, de viver
Tô morrendo, de vontade
De você!...

 Fábio Jr.

Dia dos Namorados

Diz um ditado popular que
"o amor é uma flor roxa que nasce no coração dos trouxas". 
E numa canção do tempo de ouro do rádio, 
cantada por Carmem Miranda, também ouvimos: 
"essa história de gostar de alguém/é uma mania que as pessoas têm/
se me ajudasse, nosso Senhor/eu não pensaria mais no amor".
Ninguém é trouxa por amar, 
o amor é considerado um dos sentimentos mais nobres do ser humano, 
mas que parece uma mania, ah, lá isso parece. 
Basta dar uma olhadinha na internet para ver a quantidade de sites de namoro, 
relacionamentos e encontros. 
Todo mundo atrás de um amor.
As paqueras no colégio, nos bares, na praia, cartas, torpedos,
telefonemas, e-mails, a flecha do cupido encorajando os corações
- dos mais arrojados aos mais tímidos - a se declararem.
 A irem em busca de seu par.
Conta uma antiga lenda que, no princípio,
homens e mulheres eram uma coisa só,
feminino e masculino unidos completamente,
colados um ao outro em um abraço universal. 
Castigados pelos deuses, por tentarem se igualar a eles, 
foram descolados para sempre e, por conta disso, 
vivem buscando até hoje a outra metade descolada. 
Sua metade da laranja.





Mania ou não, 
bom mesmo é estarmos com nossa metade no dia dos namorados.
E nos sentirmos mais nobres, mais completos, por amar, amar, amar...

quinta-feira, 27 de maio de 2010

Junho

Eu sei que é junho, o doido e gris seteiro
Com seu capuz escuro e bolorento
As setas que passaram com o vento
Zunindo pela noite, no terreiro
Eu sei que é junho!

Eu sei que é junho, esse relógio lento

Esse punhal de lesma, esse ponteiro,
Esse morcego em volta do candeeiro
E o chumbo de um velho pensamento

 


Eu sei que é junho, o barro dessas horas
O berro desses céus, ai, de anti-auroras
E essas cisternas, sombra, cinza, sul

E esses aquários fundos, cristalinos

Onde vão se afogar mudos meninos
Entre peixinhos de geléia azul
Eu sei que é junho!


Alceu Valença

La Belle De Jour

Ah hei! Ah hei! Ah hei!
Ah! La Belle de Jour!
Ah hei! Ah hei! Ah hei!

Eu lembro da moça bonita
Da praia de Boa Viagem
E a moça no meio da tarde
De um domingo azul
Azul, era Belle de Jour
Era a bela da tarde
Seus olhos azuis como a tarde
Na tarde de um domingo azul
La Belle de Jour!...

Belle de Jour!
Oh! Oh!
Belle de Jour!

La Belle de Jour
Era a moça mais linda
De toda a cidade
E foi justamente prá ela
Que eu escrevi
O meu primeiro blues...


Mas Belle de Jour
No azul viajava
Seus olhos azuis como a tarde
Na tarde de um domingo azul
La Belle de Jour!...

La Belle de Jour!...
Eu lembro da moça bonita
Da praia de Boa Viagem
E a moça no meio da tarde
De um domingo azul
Azul, era Belle de Jour
 




Era a bela da tarde
Seus olhos azuis como a tarde
Na tarde de um domingo azul
La Belle de Jour!...

Belle de Jour!
Oh! Oh!
Belle de Jour!

La Belle de Jour
Era a moça mais linda
De toda a cidade
E foi justamente prá ela
Que eu escrevi
O meu primeiro blues...

Mas Belle de Jour
No azul viajava
Seus olhos azuis como a tarde
Na tarde de um domingo azul
La Belle de Jour!..


Alceu Valença

Ventos de Junho


Ontem os ventos de junho
Dando pontadas de frio
Homens juntando madeira
Numa enorme fogueira
Queimando São João
Moças de pano e de fitas
Danças de bruxas bonitas
Festa de fogo e madeira
Velhas senhoras mineiras
Viúvas de Deus



Trilhas, picadas, atalhos
Conversa a cavalo, amizades de arreio  

E hoje, horizontes farpados, soleiras 
Trancas, tramelas, porteiras 
Que nos caminhos de Minas
Não abrem mais 


Ivan Lins

Maçã de Junho

És a estrela da alvorada
E a madrugada junto ao cais
És tudo o que eu vejo em ti,
És a alegria e muito mais
És a minha maçã de junho
És o teu corpo e o meu
Amo-te mais que à vida,
Que a vida sem ti morreu

És a erva perfumada,

Debruada a girassóis
O trago do café quente
Nas manhãs entre lençois
 



És a minha maça de junho
E a minha noite de verão
Anda, vem comigo,
Vamos,dá-me a tua mão


És o encontro na estrada,

És a montanha e o pôr do sol
O vinho bebido em festa,
És a papoila e o rouxinol

Jorge Palma

Na Subida do Balão


Calendário tá dizendo
Chegou seu mês de junho e
Chegou São João Doidão

Vai ter festa na rua
Vai ter traque de véia na subida do balão
Seu Zé Mário é um festeiro
Chamou os violeiros
Principiando o rastapé
Sanfoneiro puxa o fole
Nós aqui puxemos o gole
De fazer bem buscapé




Acenderam a fogueira 
A quadrilha pegou fogo 
Mal a lenha virou brasa
Uma morena abriu seu jogo
Pras beatas fofoqueiras
Esta moça é janeleira e
Não tem mais jeito não
Pra essa véias fofoqueiras
Quando a moça é janeleira
É igualzinha a de salão

Mas na lua da ribeira
Minha nova companheira
Sem ligar pras casadeiras
Entregou seu coração


Almir Sater

Quando o Junho Chega

Tudo são canções
Foguetes, balões
Quando o Junho chega

há alegria a rodos

Bailamos nós todos
Quando o junho chega

E a natureza

Mostra mais beleza
Quando o junho chega

 


Nascem as paixões
Bailam ilusões
Quando o junho chega

Olha a rusga, que ali vai

Vamo-nos juntar a ela
pois no mês de junho
É que a rusga sai 


Antônio Mafra

quarta-feira, 12 de maio de 2010

Canção Negra - 13 de Maio -Dia da Discriminação Racial


Ó boca em tromba retorcida
Cuspindo injúrias para o Céu,
Aberta e pútrida ferida
Em tudo pondo igual labéu.

Ó boca em chamas, boca em chamas,
Da mais sinistra e negra voz,
Que clamas, clamas, clamas, clamas,
Num cataclismo estranho, atroz.



Ó boca em chagas, boca em chagas,
Somente anátemas a rir,
De tantas pragas, tantas pragas
Em catadupas a rugir.

Ó bocas de uivos e pedradas,
Visão histérica do Mal,
Cortando como mil facadas
Dum golpe só, transcendental.

Sublime boca sem pecado,
Cuspindo embora a lama e o pus,
Tudo a deixar transfigurado,
O lodo a transformar em luz.

Boca de ventos inclemente
De universais revoluções,
Alevantando as hostes quentes,
Os sanguinários batalhões.

Abençoada a canção velha
Que os lábios teus cantam assim
Na tua face que se engelha,
Da cor de lívido marfim.
Parece a furna do Castigo
Jorrando pragas na canção,
A tua boca de mendigo,
Tão tosco como o teu bordão.

Boca fatal de torvos trenos!
Da onipotência do bom Deus,
Louvados sejam tais venenos,
Purificantes como os teus!
Tudo precisa um ferro em brasa
Para este mundo transformar...

Nos teus Anátemas põe asa
E vai no mundo praguejar!
Ó boca ideal de rudes trovas,
Do mais sangrento resplendor,
Vai reflorir todas as covas,
O facho a erguer da luz do Amor.

Nas vãs misérias deste mundo
Dos exorcismos cospe o fel...
Que as tuas pragas rasguem fundo
O coração desta Babel.

Mendigo estranho! Em toda a parte
Vai com teus gritos, com teus ais,
Como o simbólico estandarte
Das tredas convulsões mortais!
Resume todos esses travos
Que a terra fazem languescer.

Das mãos e pés arranca os cravos
Das cruzes mil de cada Ser.

A terra é mãe! -- mas ébria e louca
Tem germens bons e germens vis...
Bendita seja a negra boca
Que tão malditas coisas diz!


Cruz e Souza

segunda-feira, 10 de maio de 2010

Sapato Velho


Você lembra, lembra
Daquele tempo
Eu tinha estrelas nos olhos
Um jeito de herói
Era mais forte e veloz
Que qualquer mocinho
De cowboy

Você lembra, lembra
Eu costumava andar
Bem mais de mil léguas
Prá poder buscar
Flores-de-maio azuis
E os seus cabelos enfeitar

Água da fonte
Cansei de beber
Prá não envelhecer
 

Como quisesse
Roubar da manhã
Um lindo pôr-de-sol
Hoje não colho mais
As flores-de-maio
Nem sou mais veloz
Como os heróis

É, talvez eu seja
Simplesmente
Como um sapato velho
Mas ainda sirvo
Se você quiser
Basta você me calçar
Que eu aqueço o frio
Dos seus pés

Água da fonte
Cansei de beber
Prá não envelhecer
Como quisesse
Roubar da manhã
Um lindo pôr-de-sol
Hoje não colho mais
As flores-de-maio
Nem sou mais veloz
Como os heróis

É, talvez eu seja
Simplesmente
Como um sapato velho
Mas ainda sirvo
Se você quiser
Basta você me calçar
Que eu aqueço o frio
Dos seus pés

Talvez eu seja
Simplesmente
Como um sapato velho
Mas ainda sirvo
Se você quiser
Basta você me calçar
Que eu aqueço o frio
Dos seus pés





Roupa Nova

sábado, 8 de maio de 2010

Mãe


Certa vez, perguntaram à Dona Olinda qual era o seu
filho preferido, aquele que ela mais amava.
Ela, deixando entrever um sorriso, respondeu:
-Nada é mais volúvel que um coração de mãe.
E, como mãe lhe respondo:
o filho preferido é aquele a quem me dedico de corpo e alma,
é o filho doente, até que se sare.
O que partiu, até que volte.
O que está cansado, até que descanse.
O que está com fome, até que se alimente.
O que está com sede, até que beba.
O que está estudando, até que aprenda.
O que está nu, até que se vista.
O que não trabalha, até que se empregue.
O que namora, até que se case.
O que casa, até que conviva.
O que é pai, até que crie.
O que prometeu, até que se cumpra.
O que deve, até que pague.
O que chora, até que se cale.
E já com o semblante bem distante daquele sorriso,
completou Dona Olinda:
-O que já me deixou, até que o reencontre.


Do livro: Palavras Encantadas; 
Durval Ângelo e Ana Maria Gonçalves

terça-feira, 4 de maio de 2010

Ser Mãe


A missão de ser mãe quase sempre começa com alguns meses de muito enjôo,
seguido por anseios incontroláveis por comidas estranhas, aumento de peso,
dores na coluna, o aprimoramento da arte de arrumar travesseiros preenchendo
espaços entre o volume da barriga e o resto da cama.
Ser mãe é não esquecer a emoção do primeiro movimento do bebezinho dentro da
barriga.
O instante maravilhoso em que ele se materializou ante os seus olhos, a
boquinha sugando o leite, com vontade, e o primeiro sorriso de
reconhecimento.


Ser mãe é ficar noites  sem dormir, é sofrer com as cólicas do bebê e se
angustiar com os choros inexplicáveis: será dor de ouvido, fralda molhada,
fome, desejo de colo?
  É a inquietação com os resfriados, pânico com a ameaça de pneumonia, coração
partido com a tristeza causada pela morte do bichinho de estimação do
pequerrucho.
Ser mãe é ajudar o filho a largar a chupeta e a mamadeira. É levá-lo para a
escola e segurar suas mãos na hora da vacina.
Ser mãe é se deslumbrar em ver o filho se revelando em suas características
únicas, é observar suas descobertas.
Sentir sua mãozinha procurando a proteção da sua, o corpinho se aconchegando
debaixo dos cobertores.
É assistir aos avanços, sorrir com as vitórias e ampará-lo nas pequenas
derrotas. É ouvir as confidências.
Ser mãe é ler sobre uma tragédia no jornal e se perguntar: E se tivesse sido
meu filho?
E ante fotos de crianças famintas, se perguntar se pode haver dor maior do
que ver um filho morrer de fome.
Ser mãe é descobrir que se pode amar  ainda mais um homem ao vê-lo passar
talco, cuidadosamente, no bebê ou ao observá-lo sentado no chão, brincando
com o filho.
É se apaixonar de novo pelo marido, mas por razões que antes de ser mãe
consideraria muito pouco românticas.
É sentir-se invadir de felicidade ante o milagre que é uma criança dando
seus primeiros passos, conseguindo expressar toscamente em palavras seus
sentimentos, juntando as letras numa frase.
Ser mãe é se inundar de alegria ao ouvir uma gargalhadinha gostosa, ao ver o
filho acertando a bola no gol ou mergulhando corajosamente do trampolim mais
alto.
Ser mãe é descobrir que, por mais sofisticada que se possa ser, por mais
elegante, um grito aflito de mamãe a faz derrubar o suflê ou o cristal mais
fino, sem a menor hesitação.
Ser mãe é descobrir que sua vida tem menos valor depois que chega o bebê.
Que se deseja sacrificar a vida para poupar a do filho, mas ao mesmo tempo
deseja viver mais º não para realizar os seus sonhos, mas para ver a criança
realizar os dela.
É ouvir o filho falar da primeira  namorada , da primeira decepção e quase
morrer de apreensão na primeira vez que ele se aventurar ao volante de um
carro.
É ficar acordada de noite, imaginando mil coisas, até ouvir o barulho da
chave na fechadura da porta e os passos do jovem, ecoando portas adentro do
lar.


Finalmente, é se inundar de gratidão por tudo que se recebe e se aprende com
o filho, pelo crescimento que ele proporciona, pela alegria profunda que ele
dá.
Ser mãe é aguardar o momento de ser avó, para renovar as etapas da emoção,
numa dimensão diferente de doçura e entendimento.
É estreitar nos braços o filho do filho e descobrir no rostinho minúsculo,
os traços maravilhosos do bem mais precioso que lhe foi confiado ao coração:
um Espírito imortal vestido nas carnes de seu filho. A maternidade é uma dádiva. Ajudar um pequenino a desenvolver-se e a
descobrir-se, tornando-se um adulto digno, é responsabilidade que Deus
confere ao coração da mulher que se transforma em mãe.

E  toda mulher que se permite ser mãe, da sua ou da carne alheia, descobre que o filho que depende do seu amor e da segurança que ela transmite, é o
melhor presente que Deus lhe deu.

Cidadão

Tá vendo aquele edifício moço?
Ajudei a levantar
Foi um tempo de aflição
Eram quatro condução
Duas pra ir, duas pra voltar
Hoje depois dele pronto
Olho pra cima e fico tonto
Mas me chega um cidadão
E me diz desconfiado, tu tá aí admirado
Ou tá querendo roubar?
Meu domingo tá perdido
Vou pra casa entristecido
Dá vontade de beber
E pra aumentar o meu tédio
Eu nem posso olhar pro prédio
Que eu ajudei a fazer

Tá vendo aquele colégio moço?
Eu também trabalhei lá
Lá eu quase me arrebento
Pus a massa fiz cimento
Ajudei a rebocar
Minha filha inocente
Vem pra mim toda contente
Pai vou me matricular
Mas me diz um cidadão
Criança de pé no chão
Aqui não pode estudar
Esta dor doeu mais forte
Por que que eu deixei o norte
Eu me pus a me dizer
Lá a seca castigava mas o pouco que eu plantava
Tinha direito a comer

Tá vendo aquela igreja moço?
Onde o padre diz amém
Pus o sino e o badalo
Enchi minha mão de calo
Lá eu trabalhei também
Lá sim valeu a pena
Tem quermesse, tem novena
E o padre me deixa entrar
Foi lá que cristo me disse
Rapaz deixe de tolice
Não se deixe amedrontar

Fui eu quem criou a terra
Enchi o rio fiz a serra
Não deixei nada faltar
Hoje o homem criou asas
E na maioria das casas
Eu também não posso entrar

Fui eu quem criou a terra
Enchi o rio fiz a serra
Não deixei nada faltar

Hoje o homem criou asas
E na maioria das casas
Eu também não posso entrar


Composição: Lucio Barbosa

sexta-feira, 30 de abril de 2010

Mês de Maio



Azul do céu brilhou
E o mês de maio, enfim chegou
Olhos vão se abrir, pra tanta cor
É mês de maio, a vida tem seu esplendor
A luz do sol entrou
Pela janela e convidou
Pra tarde tão bela, e sem calor
É mês de maio, saio e vou ver o sol se pôr
Horizonte, de aquarela, que ninguém jamais pintou
E um enxame, de estrelas, diz que o dia terminou

Noite nem se firmou
E a lua cheia, já clareou
Sombras podem vir, façam favor
É mês de maio, é tempo de ser sonhador


Quem não se enamorou
No mês de maio, bem que tentou
E quem não tiver, ainda amor
Dos solitários, o mês de maio é o protetor

Boa terra, velha esfera, que nos leva aonde for
Pro futuro, quem nos dera, que te dessem mais valor


Almir Sater

segunda-feira, 26 de abril de 2010

Eu Que Não Dei Quase Nada do Mar



Garimpeira da beleza
Te achei na beira de você me achar
Me agarra na cintura, me segura e jura que não vai soltar
E vem me bebendo toda, me deixando tonta de tanto prazer
Navegando nos meios seios, mar partindo ao meio
Não vou esquecer

Eu que não sei quase nada do mar

Descobri que não sei nada de mim

Clara, noite rara, nos levando além

da arrebentação
Já não tenho medo de saber quem somos
na escuridão

Me agarrei nos seus cabelos

Sua boca quente pra não me afogar
Tua língua correnteza lambe minhas pernas
Como faz o mar
 


E vem me bebendo toda, me deixando tonta de tanto prazer
Navegando nos meus seios, mar partindo ao meio
Não vou esquecer

Eu que não sei quase nada do mar

Descobri que não sei nada de mim.
Ana Carolina

domingo, 25 de abril de 2010

Pensamentos Mirabolantes

"O đєstiησ đєciđє qµєм єηtrα ηα мiηhα viđα, 
мiηhα αtitµđє đєciđє qµєм fica."

"Incertos são nossos amores, e por isso é tão importante sentir-se bem mesmo estando só." 

"Já tive torres internas que foram ao chão.
Torres altas demais para mim, torres que nem chegaram a ficar concluídas
(as de dentro nunca se concluem),
torres que me exigiram esforço e que me deram prazer,
até que alguém, com uma frase,
ou com um gesto, as fez virem abaixo.
Tinha gente dentro, tinha eu."
 
"Ser feliz de uma forma realista
é fazer o possível e aceitar o improvável.
Fazer exercícios sem almejar passarelas,
trabalhar sem almejar o estrelato,
amar sem almejar o eterno."
 
"Acredito em saudade, sei o quanto uma ausência pode doer, provocar contração muscular e até náusea. 
 
"Quanto mais escrava
mais escrevo
pra libertar essa mulher da vida
que me habita."
 
 
 "Leia, e seu silêncio ganhará voz."
  
 
"Se eu pudesse, pegava a dor, colocava a dor dentro de um envelope e devolvia ao remetente."
 
"Eu me esqueci no armário. 
Pensei estar vivendo,
estudando, trabalhando, sendo!

Pensei ter amado e odiado,
aprendido e ensinado,
fugido e lutado,
confundido e explicado.

Mas hoje, surpreso,
me vi no armário embutido 

calado, sozinho, perdido, parado.
"

E Quem se Importa

Eu sou lúcida na minha loucura, permanente na minha inconstância, inquieta na minha comodidade. Pinto a realidade com alguns sonhos, e transformo alguns sonhos em cenas reais.

Choro lágrimas de rir e quando choro pra valer não derramo uma lágrima. Amo mais do que posso e, por medo, sempre menos do que sou capaz.


Busco pelo prazer da paisagem e raramente pela alegre frustração da chegada. Quando me entrego, me atiro e quando recuo não volto mais.


Mas não me leve a sério, sei que nada é definitivo.

Nem eu sou o que penso que eu sou.
Nem nós o que a gente pensa que tem.

Prefiro as noites porque me nutrem na insônia, embora os dias me iluminem quando nasce o sol. Trabalho sem salário e não entendo de economizar.

Nem de energia. Esbanjo-me até quando não devo e, vezes sem conta, devo mais do que ganho.

Não acredito em duendes, bruxas, fadas ou feitiços. Não vou à missa. Nem faço simpatias. Mas, rezo pra algum anjo de plantão e mascaro minha fé no deus do otimismo.


Quando é impossível, debocho. Quando é permitido, duvido. Não bebo porque só me aceito sóbria, fumo pra enganar a ansiedade e não aposto em jogo de cartas marcadas.


Penso mais do que falo. E falo muito, nem sempre o que você quer saber. Eu sei. Gosto de cara lavada — exceto por um traço preto no olhar — pés descalços, nutro uma estranha paixão por camisetas velhas e sinto falta de uma tatuagem no lado esquerdo das costas.


Mas há uma mulher em algum lugar em mim que usa caros perfumes, sedas importadas e brilho no olhar, quando se traveste em sedução.


Se você perceber qualquer tipo de constrangimento, não repare, eu não tenho pudores mas, não raro, sofro de timidez. E note bem: não sou agressiva, mas defensiva.

Impaciente onde você vê ousadia.
Falta de coragem onde você pensa que é sensatez.

Mas mesmo assim, sempre pinta um momento qualquer em que eu esqueço todos os conselhos e sigo por caminhos escuros. Estranhos desertos.

E, ignorando todas as regras, todas as armadilhas dessa vida urbana, dessa violência cotidiana, se você me assalta, eu reajo.



Martha Medeiros

:: 

segunda-feira, 19 de abril de 2010

Tema De "os Inconfidentes"

Toda vez que um justo grita
Um carrasco o vem calar
Quem não presta fica vivo
Quem é bom, mandam matar
Quem não presta fica vivo
Quem é bom, mandam matar

Foi trabalhar para todos

E vede o que lhe acontece
Daqueles a quem servia
Já nenhum mais o conhece
Quando a desgraça é profunda
Que amigo se compadece?

Foi trabalhar para todos

Mas, por ele, quem trabalha?
Tombado fica seu corpo
Nessa esquisita batalha
Suas ações e seu nome
Por onde a glória os espalha?

Por aqui passava um homem

(E como o povo se ria!)
Que reformava este mundo
De cima da montaria
Por aqui passava um homem
(E como o povo se ria!)
Ele na frente falava
E atrás a sorte corria

Por aqui passava um homem

(E como o povo se ria!)
Liberdade ainda que tarde
Nos prometia
Por aqui passava um homem
(E como o povo se ria!)
No entanto à sua passagem
Tudo era como alegria

Por aqui passava um homem

(E como o povo se ria!) 



Liberdade ainda que tarde
Nos prometia

Toda vez que um justo grita

Um carrasco o vem calar
Quem não presta fica vivo
Quem é bom, mandam matar
Quem não presta fica vivo
Quem é bom, mandam matar







Chico Buarque de Holanda
 

Um Índio

Um índio descerá de uma


 estrela 
colorida e brilhante 
De uma estrela que virá 
numa velocidade estonteante
E pousará no coração do hemisfério sul, 

 na América, 
num claro instante
Depois de exterminada 
 a última nação indígena
E o espírito dos pássaros 

das fontes de água límpida 
Mais avançado que a mais avançada 
das mais avançadas das tecnologias
Virá, 
impávido que nem Muhammed Ali, 
virá que eu vi
Apaixonadamente como Peri, 

virá que eu vi
Tranqüilo e infalível como Bruce Lee, 

virá que eu vi
O axé do afoxé, 

filhos de Ghandi, virá
Um índio preservado 
em pleno corpo físico
Em todo sólido, 

todo gás e todo líquido
Em átomos, palavras, 

alma, cor, em gesto e cheiro
Em sombra, em luz, em som magnífico


Num ponto equidistante 
entre o Atlântico e o Pacífico
Do objeto, sim, 

resplandecente descerá o índio
E as coisas que eu sei que ele dirá, 

fará, não sei dizer
Assim, de um modo explícito

E aquilo que nesse momento 
se revelará aos povos
Surpreenderá a todos,

não por ser exótico
Mas pelo fato de poder 

ter sempre estado oculto
Quando terá sido o óbvio




Caetano Veloso