Quero um beijo sem fim,
Que dure a vida inteira
e aplaque o meu desejo!
Ferve-me o sangue.
Acalma-o com o teu beijo,
Beija-me assim!
O ouvido fecha ao rumor
Do mundo, e beija-me, querida!
Vive só para mim, só para a minha vida,
Só para o meu amor!
De arrebol a arrebol,
vão-se os dias sem conto!
E as noites, como os dias,
sem conto vão-se, cálidas ou frias!
Rutile o sol
Esplêndido e abrasador!
No alto as estrelas coruscantes,
Tauxiando os largos céus,
brilhem como diamantes!
Brilhe aqui dentro o amor!
Suceda a treva à luz!
Vele a noite de crepe a curva do horizonte;
Em véus de opala a madrugada aponte
Nos céus azuis,
E Vênus, como uma flor,
brilhe, a sorrir, do ocaso à porta,
brilhe à porta do oriente!
A treva e a luz - que importa?
Só nos importa o amor!
Raive o sol no verão!
Venha o outono!
Do Inverno os frígidos vapores
Toldem o céu! das aves e das flores
venha a estação!
Que nos importa o esplendor
Da primavera, e o firmamento
Limpo, e o sol cintilante,
e a neve, e a chuva, e o vento?
- Beijemo-nos amor!
Beijemo-nos! Que o mar
Nossos beijos ouvindo,
em pasmo a voz levante!
E cante o sol! a ave desperte e cante!
Cante o luar.
Cheio de um novo fulgor!
Cante a amplidão!
Cante a floresta!
E a natureza toda, em delirante festa,
Cante, cante este amor!
Rasgue-se, à noite, o véu das neblinas,
e o vento inquira o monte e o vale:
"Quem canta assim?"
E uma áurea estrela fale
Do alto do céu
ao mar, presa de pavor:
"Que agitação estranha é aquela?"
E o mar adoce a voz, e à curiosa estrela
Responda que é o amor!
E a ave, ao sol da manhã,
Também, a assa vibrando,
à estrela que palpita
Responda, ao vê-la desmaiada e aflita:
"Que beijo, irmã!
Pudesses ver com que ardor
Eles se beijam loucamente!"
E inveje-nos a estrela...
e apague o olhar dormente,
Morta, morta de amor!...
Diz tua boca: "Vem!"
"Inda mais!" diz a minha,
a soluçar...Exclama
Todo o meu corpo que o teu corpo chama:
"Morde também!"
Ai! morde! que doce é a dor
Que me entra as carnes, e as tortura!
Beija mais! morde mais! que eu morra de ventura,
Morro por teu amor!
Ferve-me o sangue:
acalma-o com teu beijo!
Beija-me assim!
O ouvido fecha ao rumor
Do mundo, e beija-me, querida!
Vive só para mim, só para a minha vida,
Só para o meu amor!
Olavo Bilac