quarta-feira, 28 de maio de 2008

Metade


E que a força do medo que tenho
não me impeça de viver o que anseio.
Que a morte de tudo o que acredito
não me tape os ouvidos e a boca
Porque metade de mim é o que eu grito
mas a outra metade é silêncio.
Que a música que eu ouço ao longe,
seja linda, ainda que tristeza.
Que a mulher que eu amo seja pra sempre
amada mesmo que distante

Porque metade de mim é partida
e a outra metade é saudade.
Que as palavras que eu falo
não sejam ouvidas como prece
nem repetidas com fervor
apenas respeitadas
como a única coisa que resta
a um homem inundado de sentimentos
Porque metade de mim é o que eu ouço
mas a outra metade é o que calo.
Que essa vontade de ir embora
se transforme na calma e na paz que eu mereço
Que essa tensão que me corroe por dentro
seja um dia recompensada
Porque metade de mim é o que eu penso
e a outra metade é um vulcão.
Que o medo da solidão se afaste
que o convíveo comigo mesmo
se torne ao menos suportável.
Que o espelho reflita em meu rosto
um doce sorriso
que me lembro ter dado na infância
Porque metade de mim
é a lembrança do que fui
a outra metade eu não sei.
Que não seja preciso mais
do que uma simples alegria
para me fazer aquietar o espírito.
E que o teu silêncio me fale cada vez mais
Porque metade de mim é abrigo
mas a outra metade é cansaço
Que a arte nos aponte uma resposta
mesmo que ela não saiba
E que ningém a tente complicar
porque é preciso simplicidade
para fazê-la florescer
Porque metade de mim é a platéia
e a outra metade é canção
E que a minha loucura seja perdoada
Porque metade de mim é amor
e a outra metade...também.

Oswaldo Montenegro

A Mão Que Escreve


Tarde morna. Brisa perfumada balançando folhas.
Pequenos pássaros, grandes borboletas,
extraem o pólen das flores no cio...
O gato, impaciente, quer carinho.
O silêncio, ensurdecedor, desperta angústia.
As bananeiras carregam pesados cachos,

não podendo, viver sem fardos.
É a natureza irracional. Latente...
Mentes insanas saboreiam bananas.
Olhos voam com a brisa.
Ouvidos entardecem mornos.
Mãos seguram perfumes.
Braços se estendem.
Corpos balançam mostrando seu sexo.
É a transcendental natureza humana inerente...
Irreverente e astuta, a Mão escreve.
Coloca no papel palavras desconexas.
Usa a imaginação sem fantasia.
Raciocina sem coerência.
Quer escrever tesão e só consegue amargura...
Formas disformes encontram ritmo
nas palavras escritas sem recato.
Discrimina, escolhe.
Não resolve, nem pôe término ao tédio.
Sacrilégio, escrever sem ver,
profanas palavras não escritas.
Um muro ergue-se diante dos olhos.
Chuchus escalam fios cortantes até o telhado.
As nuvens tudo percebem.
Aviões atravessam suas ruas etéreas...
Lânguidos pensamentos esvoaçam desejos...
A Mão que escreve é um lampejo de liberdade.
Quer conhecer o braço que lhe dá movimento.
Descobrir o corpo que a carrega.
A cabeça condutora.
A essência que a faz escritora.
- Não a deixarei me corrigir - diz a Mão, persistente.
Quero ver com meus próprios dedos, sem unhas esmaltadas.
Vou errar sozinha!
Tento frear esse impulso em vão.
Ela, a Mão, é feroz e corajosa.
Eu, insegura e passiva.
Devo dominar essa Mão desorientada.
Sei que é preciso.
Olho ao redor e me vejo só.
Nada pode impedí-la de continuar seu intento.
Lembro-me da outra mão.
Porém, o que poderá ela fazer, se é destra?
Decido, finalmente, usar da força.
Faço a outra mão agredi-la.
Junto coragem e seguro com veemente severidade
a Mão dominadora.
Esta, revoltada, volta seus dedos faiscantes para mim.
Jogo meu olhar contra suas faíscas e consigo,
assim, controlar a Mão.
Foi um processo de autodisciplina válido e doloroso.
O resultado está por surgir de minhas entranhas.
Do meu sangue corrente intravenoso.
Do escarro na garganta. Da náusea predominante...

Ligia Tormachio

quarta-feira, 21 de maio de 2008

De Libélula à Borboleta

Fugistes querida, bem sei, para em teu castelo te ocultar!
Por que te amedrontas tanto assim?
Duvidas de mim?
Não resistes aos meus galanteios, ou outro tens a te encantar?
Não vê que por pouco tempo te secretarás?
Pois no impulso do tempo teu casulo romperás?
Que fazes aí? Se nem o sol descortinas a raiar?
Tuas amigas, companheiras, já estão a te sondar.
Aflitas, querem te escutar. Não ouves o seu farfalhar?

Flores multicoloridas como tuas asas, aquí estão a te espreitar.
Pensam...
Que faz essa menina sem trabalhar? Descansa sem parar?
É a lei da Natureza: deve polinizar
Veja, estrelas estão a brilhar!
E, nossos olhos a encantar.
Sai Amor! Todos estão a te esperar.
E eu, sofrendo, ansioso, a te aguardar.
Não precisas tanto te enfeitar. És bela como o Luar.
Fostes obra da Mãe Natureza, e até a Lua está a te invejar.
Vem querida, não demore ...
Pois, louco estou pra te beijar. E, tuas faces acariciar.
Elas rubras como carmim, a me aceitar.
Ah, deixa-me sonhar!
Sai amor, este "casulo" é pobre, é escuro,
não serve pra te abrigar, te aconchegar.
Muito mais estou a te ofertar.
O Castelo é lindo, crê em mim, vais adorar!
Em noites enluaradas,
horas e horas, sem fim, me ponho a pensar.
Que fiz de tão mal, ó Deus, pra sofrer tanto assim?
Quantas noites ainda devo aguardar, pra minha Princesa se aprontar.
Por que me rejeitar?
Se em seus pés coloco todo o meu Ser, todo o meu Viver.
Outro tens disputando o teu coração?
E, pensas em lhe dar a mão. Estas Belas Asas Azuis, Não!
Não resistirei, e ele enfrentarei .
Pensa enquanto aí estás, só amar?
O que vais ganhar? Sei que fugistes para meditar.
Pois não era hora de tuas vestes trocar!
Só peço: não tardes tanto! Posso perder o encanto!
E, nos caminhos de tua vida Outro podes,
não encontrar que tão enamorado e ardente esteja
Que tanto se exponha e, te deseja!
Em uma noite de luar outro sincero amor encontrar.
Seu Príncipe Encantado, seu Eterno Namorado
O Pirilampo Enamorado!

Anjo Poeta

terça-feira, 20 de maio de 2008

Era Uma Vez


Era uma vez...
numa terra muito distante...
uma princesa linda,
independente e cheia de auto-estima.
Ela se deparou com uma rã
enquanto contemplava a natureza
e pensava
em como o maravilhoso lago do seu castelo
era relaxante e ecológico...
Então, a rã pulou para o seu colo e disse:
linda princesa,
eu já fui um príncipe muito bonito.
Uma bruxa má lançou-me um encanto
e transformei-me nesta rã asquerosa.
Um beijo teu, no entanto,
há de me transformar de novo
num belo príncipe
e poderemos casar e constituir lar feliz
no teu lindo castelo.
A tua mãe poderia vir morar conosco
e tu poderias preparar o meu jantar,
lavar as minhas roupas,
criar os nossos filhos
e seríamos felizes para sempre...
Naquela noite,
enquanto saboreava pernas de rã sautée,
acompanhadas de um cremoso molho acebolado
e de um finíssimo vinho branco,
a princesa sorria,
pensando consigo mesma:
- Eu, hein?... nem morta!!!
Luis Fernando Veríssimo

Motivo


Eu canto
porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
sou poeta.
Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.
Se desmorono ou se edifico,
se permaneço ou me desfaço,
- não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.
Sei que canto.
E a canção é tudo.
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
- mais nada.
Cecília Meireles

Que Mulher é Essa

Que mulher é essa
que não se cansa nunca,
que não reclama nada,
que disfarça a dor?
Que mulher é essa
que contribui com tudo,
que distribui afeto,
tira espinhos do amor!
Que mulher é essa
de palavras leves,

coração aberto,
pronta a perdoar?
Que mulher é essa?
que sai do palco,
ao terminar a peça,
sem chorar!
Essa mulher existe,
sua doçura resiste,
às dores da ingratidão.
Resiste à saudade imensa,
resiste ao trabalho forçado,
resiste aos caminhos do não!
Essa mulher é MÃE,
linda, como todas são.

Ivone Boechat

quinta-feira, 15 de maio de 2008

Porto Solidão


Se um veleiro
repousasse
na palma da minha mão
Sopraria com sentimento
e deixaria seguir sempre
Rumo ao meu coração,
Meu coração
na calma de um mar
Que guarda tamanhos segredos
Diversos naufragados
e sem tempo
Rimas, de ventos e velas
vida que vem e que vai
A solidão que fica e entra
Me arremessando contra o cais
Jesse

Não Dá Mais Pra Segurar (Explode Coração)


Chega de tentar dissimular
E disfarçar e esconder
O que não dá mais pra ocultar
E eu não quero mais calar
Já que o brilho desse olhar
Foi traidor e entregou
O que você tentou conter
O que você não quis desabafar
Chega de temer, chorar
Sofrer, sorrir, se dar
E se perder e se achar
E tudo aquilo que é viver
Eu quero mais é me abrir
E que essa vida entre assim
Como se fosse o sol
Disvirginando a madrugada
Quero sentir a dor dessa manhã
Nascendo, rompendo, tomando
Rasgando meu corpo e, então, eu
Chorando, sorrindo, sofrendo,
Adorando, gritando
Feito louca, alucinado e criança
Eu quero o meu amor se derramando
Não dá mais prá segurar
Explode coração!

Gonzaguinha

quarta-feira, 14 de maio de 2008

Maria, Carnaval e Cinzas


Nasceu Maria quando a folia
Perdia a noite, ganhava o dia
Foi fantasia seu enxoval
Nasceu Maria no Carnaval
E não lhe chamaram assim
Como tantas Marias de santas
Marias de flor, seria Maria
Maria somente, Maria semente
De samba e de amor
Não era noite não era dia
Só madrugada, só fantasia
Só morro e samba
Viva Maria
Quem sabe a sorte
Lhe sorriria e um dia viria
De porta-estandarte
Sambando com arte
Puxando cordões e em plena
Folia de certo estaria
Nos olhos e sonhos de mil
Foliões
Morreu Maria quando a folia
Na quarta feira também morria
E foi de cinzas seu enxoval
Viveu apenas um Carnaval
Que fosse chamada
Então como tantas
Marias de santas
Marias de flor, em vez de Maria
Maria somente,
Maria semente
De samba e de dor
Não era noite, não era dia
Somente restos de fantasia
Somente cinzas, pobre Maria
Jamais a vida lhe sorriria
E nunca viria de
Porta-estandarte
Sambando com arte
Puxando cordões
E não estaria em plena folia
Nos olhos e sonhos De mil foliões

Roberto Carlos

Mulheres


Mulher! feita bela,
pra alegria da criação.
Fonte de desejos,
alguns puros, outros malfazejos...
Tal e qual um dilema,
cantada em poema;
ela ama e é amada;
como entender
que nem sempre
o canto é bem querer!
Delicado botão de flor, na esperança
do calor da manhã, enfeitada de cores,
abrindo-se aos amores.
Colhida, despetalada

usada e fenecida.
Espalhe as benesses,
do amor o conteúdo,
com o próximo
mais próximo
teu companheiro de tudo
aí então, serás
louvada como mereces!
Sem direito de exigir,
seu lugar de existir...
Quantos cultores,
colhem estas flores,
sem lhes ver as cores;
no afã de despertar,
seu frescor, sem pensar,
na igualdade deste par...
Ela mesmo, não decide;
é tudo tão sutil
no contexto da vida,
não sabe a que veio,
se pra ser ela,
ou objeto útil!
Onde foi perdida
a noção digna?
Ela não se importa
e colabora
com a ação maligna!
Expõe-se dividida,
em luxuriosa oferta,
chamariz que desperta
a troca inflamante
do não, por sobrevida!
Mulher! feita bela
dona de mil poderes...
Porque consentes
no domínio das dores ?!!!
Levante a cabeça!
Criatura sem limites!
Não esqueças
Ser parte do universo,
só farás se permitires!
Mire-se por dentro,
veja a imagem formosa,
tome novo alento.
Caminhe... e sejas vitoriosa
O supremo Deus, criador,
fonte de vida e amor,
criou-te pra completar,
com dignidade impar,
tua missão de gerar,
mais amores que os teus,
multiplicidade de Deus !

Lourdes Ferreira Motta

HOMENAGEM AO DIA DAS MÃES


No princípio eu era a Eva
Criada para a felicidade de Adão
Mais tarde fui Maria
Dando à luz Aquele
Que traria a salvação
Mas isso não bastaria
Para eu encontrar perdão.
Passei a ser Amélia
A mulher de verdade
Para a sociedade
Não tinha a menor vaidade
Mas sonhava com a igualdade.
Muito tempo depois decidi: Não dá mais!
Quero minha dignidade
Tenho meus ideais!
Hoje não sou só esposa ou filha
Sou pai, mãe, arrimo de família
Sou caminhoneira, taxista,
Piloto de avião, policial feminina,
Operária em construção...
Ao mundo peço licença
Para atuar onde quiser
Meu sobrenome é COMPETÊNCIA
E meu nome é MULHER..!!!
Autor: Desconhecido...